A alegria pela IV Campanha da Fraternidade Ecumênica – CFE
As Igrejas que
integram o Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil (CONIC) assumem como
missão expressar em gestos e ações o mandato evangélico da unidade, que diz:
“Que todos sejam um, como tu, Pai, estás em mim e eu em ti; que também eles
estejam em nós, a fi m de que o mundo creia que tu me enviaste” ( Jo 17,21).
O testemunho ecumênico
coloca-se na contramão de todo tipo de competição e de proselitismo, tão
frequentes no contexto religioso. É uma clara manifestação de que o diálogo e o
testemunho conjunto são possíveis. É um apelo dirigido a todas as pessoas
religiosas e de boa vontade para que contribuam com as suas capacidades para a
promoção da convivência, da justiça, da paz e do cuidado com a criação. É,
também, uma comprovação de que Igrejas irmãs são capazes de repartir dons e
recursos na sua missão.
A caminhada
ecumênica realizada pelo CONIC tem mais de três décadas. É uma trajetória
marcada por fraternidade, confiança, parceria e protagonismo. Dessa trajetória,
podem ser destacados como expressões concretas de comunhão fraterna as três
Campanhas da Fraternidade Ecumênicas, realizadas nos anos 2000, 2005 e 2010.
Todas elas marcaram profundamente a vida das Igrejas que nelas se envolveram.
A motivação para
essas Campanhas fundamentou-se na compreensão de que, no centro da vivência
ecumênica, está a fé em Jesus Cristo. Isso se deu, porque o movimento ecumênico
está marcado pela ação e pelo desafio de construir uma Casa Comum (oikoumene)
justa, sustentável e habitável para todos os seres vivos. Essa luta é
profética, pois questiona as estruturas que causam e legitimam vários tipos de
exclusão: econômica, ambiental, social, racial e étnica. São discriminações que
fragilizam a dignidade de mulheres e homens.
É exatamente isso
que acontece quando, neste ano, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil
(CNBB) coloca outra vez à disposição do CONIC a Campanha da Fraternidade, seu
mais conhecido projeto de evangelização.
Com esse espírito,
no ano 2000, na virada do milênio e no contexto do Grande Jubileu, foi
realizada a primeira Campanha da Fraternidade Ecumênica com o tema “Dignidade
humana e paz” e com o lema “Novo milênio sem exclusões”. No ano de 2005, foi
realizada a segunda Campanha da Fraternidade Ecumênica. O tema foi
“Solidariedade e paz” e o lema “Felizes os que promovem a paz”. A Campanha
Ecumênica de 2010 provocou o debate sobre o papel da economia na sociedade. O
tema foi “Economia e vida”, aprofundado com o lema bíblico “Vocês não podem
servir a Deus e ao Dinheiro” (Mt 6,24c).
A Campanha da
Fraternidade Ecumênica de 2016 apresenta o tema “Casa Comum, nossa responsabilidade”
e tem como lema “Quero ver o direito brotar como fonte e correr a justiça qual
riacho que não seca” (Am 5,24). O objetivo principal é assegurar o direito ao
saneamento básico para todas as pessoas e empenharmo-nos, à luz da fé, por políticas
públicas e atitudes responsáveis que garantam a integridade e o futuro de nossa
Casa Comum.
Nesse tema e nesse
lema, duas dimensões básicas para a subsistência da vida são abarcadas a um só
tempo: o cuidado com a criação e a luta pela justiça, sobretudo dos países
pobres e vulneráveis. Nessa Campanha da Fraternidade Ecumênica, queremos
instaurar processos de diálogo que contribuam para a reflexão crítica dos
modelos de desenvolvimento que têm orientado a política e a economia. Faremos
essa reflexão a partir de um problema específico que afeta o meio ambiente e a
vida de todos os seres vivos, que é a fragilidade e, em alguns lugares, a
ausência dos serviços de saneamento básico em nosso país.
Perguntamos: como
estão estruturadas as nossas cidades? Quem realmente tem acesso ao saneamento
básico? No ano de 2014, o sudeste do Brasil viveu uma das maiores crises
hídricas já registradas na história recente do país. Quem foi responsabilizado
por isso? Por que os serviços de saneamento básico, considerados como direito
humano básico pela Organização das Nações Unidas, estão em disputa?
Com essa CFE
colocamo-nos em sintonia com o Conselho Mundial de Igrejas e também com o Papa
Francisco. Ambos têm chamado a atenção para o fato de que o atual modelo de desenvolvimento
está ameaçando a vida e o sustento de muitas pessoas, em especial as mais
pobres. É um modelo que destrói a biodiversidade. A perspectiva ecumênica
aponta para a necessidade de união das igrejas diante dessa questão. Nossa Casa
Comum está sendo ameaçada. Não podemos, portanto, ficar calados. Deus nos
convoca para cuidar da sua criação. Promover a justiça climática, assumir
nossas responsabilidades pelo cuidado com a Casa Comum e denunciar os pecados
que ameaçam a vida no planeta é a missão confi ada por Deus a cada um e cada
uma de nós.
É uma alegria
compartilhar que nessa CFE, além das cinco igrejas que integram o CONIC,
somaram forças também: a Aliança de Batistas do Brasil, o Centro Ecumênico de
Serviços à Evangelização e Educação Popular (CESEEP) e a Visão Mundial. Outra
novidade é que a IV Campanha da Fraternidade Ecumênica será internacional,
porque a Misereor, organização dos bispos católicos alemães para a cooperação e
o desenvolvimento, integrou-se nesse mutirão. Nossa oração e desejo é que mais
igrejas e religiões entrem nessa caminhada.
Uma Campanha da Fraternidade Ecumênica que cruza fronteiras
Desde o ano de
1958, a Misereor realiza junto às comunidades católicas da Alemanha a Campanha
de Quaresma. Esta Campanha é uma expressão concreta da comunhão e da
solidariedade da Igreja no mundo inteiro. Ao longo de sua história, a Misereor
contribuiu para fortalecer a voz dos povos do Sul, que lutam e buscam caminhos
que possam conduzir ao bem-viver todos os homens e todas as mulheres.
Acolher a Misereor
como irmã de caminhada na IV CFE significa assumir que a cooperação para o
desenvolvimento vai além de alguma ajuda pontual para algum grupo específico.
Desde uma perspectiva de fé, significa também assumir a responsabilidade comum
pelo futuro da Terra.
Ao unirem-se nessa
IV CFE, CONIC e Misereor experimentam uma nova forma de cooperação. A concepção
que orienta essa parceria é que os grandes desafios do futuro, em especial
aqueles relacionados aos direitos humanos e à justiça climática, não podem ser
enfrentados e muito menos resolvidos por um país sozinho. É necessário que essa
responsabilidade seja assumida ecumenicamente, indo além das fronteiras
geográficas e confessionais.
O Brasil e a
Alemanha são países econômica e culturalmente diferentes. A partir dessas diferenças,
entendemos que nossas responsabilidades são comuns, porém diferenciadas. A IV
CFE será um exercício de experimentar essa unidade na diversidade. É por isso
que na Alemanha o foco principal da Campanha será o “Direito e justiça”,
enfatizando que os direitos humanos, econômicos, sociais e culturais são
inegociáveis. Nesses direitos estão presentes o acesso à água potável e ao
saneamento básico.
O ano de 2015 foi
de intenso debate sobre as mudanças climáticas. No contexto de preparação para
a Conferência do Clima, promovida pelas Organizações das Nações Unidas (ONU),
foram realizados vários espaços de reflexão e reivindicação por justiça
ambiental. Duas ações expressam o comprometimento das igrejas com a justiça
climática. A primeira delas é o chamado do Conselho Mundial de Igrejas (CMI) à
“Peregrinação por justiça e paz” que denuncia a ação destrutiva do atual modelo
de desenvolvimento, os mais afetados são os mais pobres. A “Peregrinação por
justiça e paz” destaca a necessidade urgente da superação desse modelo de
desenvolvimento que está baseado no consumo e na ganância.
A segunda ação é a
Encíclica do Papa Francisco Laudato Sí’: sobre o cuidado da Casa Comum. Essa
encíclica é a voz profética que clama para que assumamos o desafio de proteger
a Casa Comum unindo-nos por um desenvolvimento sustentável e integral.
A ONU reconhece o
papel imprescindível das religiões para a promoção de mudança de valores no que
diz respeito ao meio ambiente. Ao nos unirmos como igrejas de dois países tão
diferentes, estamos assumindo a responsabilidade comum em favor da criação.
Na Alemanha, a
dimensão ecumênica não estará ausente. Ela será fortalecida pela Prece
Ecumênica para a Campanha da Quaresma. Essa prece foi elaborada de forma
conjunta por Misereor, organização católica, Pão Para o Mundo e organização
luterana, com participação do CONIC. A oração expressa a urgência de assumirmos
a responsabilidade do cuidado com a Casa Comum: Deus, justo e misericordioso, a
Tua Terra, nossa Casa Comum, está em um estado deplorável. Milhões de pessoas
sofrem com a fome. Em muitos lugares, o direito à moradia, à água e ao
saneamento básico, o direito à autodeterminação econômica, social e cultural é
largamente desrespeitado. Estas realidades são difíceis de suportar.
Assustam-nos.
Fechamos os olhos e a sensação de que “não há nada que eu possa fazer” é forte.
Paralisa-nos. Queremos sair dessa armadilha. Queremos acolher o dom da Tua
Criação e assumir a responsabilidade por ela. Por isso, necessitamos da Tua
ajuda e Te rogamos: Que o cuidado para com a nossa Casa Comum nos dê uma voz
forte para denunciar todas as formas abusivas de exploração econômica. Que o
saneamento básico e a água potável limpa se tornem acessíveis para todos os
cidadãos e todas as cidadãs. Que Tu fortaleças a nossa esperança, para que o
direito e a justiça virem realidade. Que nós, teus filhos e tuas filhas,
sejamos profetas, preparemos o caminho para o Bem Viver e que estabeleçamos,
através das nossas palavras e das nossas ações, relações dignas entre as
pessoas, para com a Criação e para contigo, Deus. Amém!
E por que discutir sobre saneamento básico no Brasil?
Como já dissemos,
o abastecimento de água potável, o esgoto sanitário, a limpeza urbana, o manejo
de resíduos sólidos, o controle de meios transmissores de doenças e a drenagem
de águas pluviais são medidas necessárias para que todas as pessoas possam ter
saúde e vida dignas.
A combinação do
acesso à água potável e ao esgoto sanitário é condição para se obter resultados
satisfatórios também na luta para a erradicação da pobreza e da fome, para a
redução da mortalidade infantil e pela sustentabilidade ambiental. Há que se
ter em mente que “justiça ambiental” é parte integrante da “justiça social”.
Segundo o
relatório “Progresso no Saneamento e Água Potável –Atualização e Avaliação dos
ODMs 2015”1 da UNICEF e da Organização Mundial de Saúde (OMS), 2,4 bilhões de
pessoas ficaram sem acesso ao saneamento melhorado no ano de 2015.
O Índice de
Desenvolvimento do Saneamento no Brasil foi de 0,581. Essa posição é inferior
aos países desenvolvidos, mesmo frente a vários países da América do Sul.
Muito embora
tenhamos uma lei que estabelece as diretrizes nacionais para o saneamento
básico, este tema permanece um dos grandes desafios para a qualidade de vida de
todas as pessoas.
A responsabilidade
pela Casa Comum é de todos, dos governantes e da população. As comunidades
cristãs são convocadas por esta Campanha da Fraternidade Ecumênica a mobilizar
em todos os municípios grupos de pessoas para reclamar a elaboração de Planos
de Saneamento Básico e exercer o controle social sobre as ações de sua
execução.
Essa ação será
orientada pelo tema da CFE “Casa Comum, nossa responsabilidade” e inspirada e
iluminada pelo lema “Quero ver o direito brotar como fonte e correr a justiça
qual riacho que não seca” (Am 5,24). Para tanto, assumimos os seguintes
objetivos:
Objetivo geral:
Assegurar o direito ao saneamento básico para todas as
pessoas e empenharmo-nos, à luz da fé, por políticas públicas e atitudes
responsáveis que garantam a integridade e o futuro de nossa Casa Comum.
Objetivos específicos:
Unir igrejas,
diferentes expressões religiosas e pessoas de boa vontade na promoção da
justiça e do direito ao saneamento básico;
Estimular o
conhecimento da realidade local em relação aos serviços de saneamento básico;
Incentivar o
consumo responsável dos dons da natureza, principalmente da água;
Apoiar e
incentivar os municípios para que elaborem e executem o seu Plano de Saneamento
Básico;
Acompanhar a
elaboração e a excussão dos Planos Municipais de Saneamento Básico;
Desenvolver a
consciência de que políticas públicas na área de saneamento básico apenas
tornar-se-ão realidade pelo trabalho e esforço em conjunto;
Denunciar a
privatização dos serviços de saneamento básico, pois eles devem ser política
pública como obrigação do Estado;
Desenvolver a
compreensão da relação entre ecumenismo, fidelidade à proposta cristã e
envolvimento com as necessidades humanas básicas.
Fonte: CNBB
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